Baleia azul: Precisamos falar sobre o jogo online que envolve suicídio e vulnerabilidade
O desafio está mais ligado à desvalorização da vida do que à depressão em si
Seja nos grupos de WhatsApp, blogs ou até em site de notícias, a expressão "baleia azul" já deve ter passado por você. Mas se você ainda não entende bem a gravidade dela, saiba que é importante continuar a ler este texto.
Isto porque a baleia azul é, na verdade, um jogo macabro que invade a seara nebulosa do abuso emocional e do suicídio, tão discutidos atualmente por causa da série "13 Reasons Why", da Netflix.
O que é?
No tal jogo, o participante deve cumprir 50 desafios em 50 dias, enviados por um curador que pede provas de que as etapas foram vencidas seja em foto ou vídeo. Entre elas estão automutilação, assistir filmes de terror na madrugada, ficar à borda de um prédio alto e, no fim, tirar a própria vida.
O nome original (“Siniy Kit”, em russo ou "Blue Whale”, em inglês) se refere a baleias que encalham na praia e acabam morrendo, supostamente por vontade própria. Todas as etapas do jogo levam o adolescente a se sentir como uma dessas baleias. Inclusive, usar a hashtag #i_am_whale” é parte dos desafios.
A história sobre o surgimento do jogo é incerta. Alguns usuários de fóruns afirmam que ele teve início na rede social russa VKontakte, outros de que partiu de uma notícia falsa sobre o suicídio de 130 adolescentes russos. Ainda há o boato de que o jogo teria sido inspirado no filme “Nerve – Um Jogo Sem Regras”, outro responsabiliza um grupo de jovens ucranianos pela ideia.
Depressão: tem a ver com isso?
Para a psicóloga Ana Café, o jogo não está necessariamente ligado à depressão, mas, sim, a fatores relacionados à impulsividade, pouca valorização da vida e materialismo. “[O fator de] sedução do jogo, na verdade, não é o suicídio, mas o desafio e o extrapolar de limites”.
Ana acredita que o comportamento hedonista -- ou seja, a busca desenfreada por prazer e gratificação a todo instante -- também é a motivação para muitos jovens entrarem no jogo. Isto porque, eventualmente, esta "caça inconsequente" resulta em falta de metas, objetivos reais e vazio interno. “Nem todo mundo consegue transcender esse caos. Isso é preocupante porque motiva comportamentos autodestrutivos como o jogo.”
Quem pode cair nessa?
Ainda de acordo com Ana, qualquer pessoa que esteja se sentindo vulnerável, inadequada ou solitária é uma isca fácil porque dificilmente encontrará uma rede de apoio. “Ela pode entrar no jogo por impulsividade, imaturidade e depois não saber como se retirar também”.
Ela lembra que o homem nasceu para viver em sociedade, se relacionar e trocar. “É importante retomar o contato do jovem com grupos diferentes, ele precisa do [coletivo] para passar pelo processo de identificação de mudanças físicas, emocionais, comportamentais”.
Claro que pessoas que já convivem com pensamentos suicidas podem se tornar alvos. Alguns sinais que podem ajudar a identificá-las: extremamente questionadoras, insatisfeitas, carregam angústia ou problema sem aparente solução, além de descrever pensamentos de solidão e desesperança. “Há uma fragilidade [nelas] perante conflito. Costumam relatar que não têm esperança e estão sem caminho e, por isso, é melhor acabar a vida, que não tem significado.”
O caminho da recuperação O suicídio -- ou a tentativa dele -- não é, em si, um artifício para chamar atenção. Os especialistas explicam que tirar a vida é a alternativa que o paciente acredita ser única para exterminar a dor emocional. “Quando eles atentam contra a própria vida é porque já deixaram de acreditar que possam ser ajudados, que haja alguma solução possível para o que estão sentindo”.
Mas é possível se recuperar deste sentimento, com terapia. E, em alguns casos, tratamento psiquiátrico aliado à medicação também está envolvido na recuperação desse tipo de pensamento. “Não tente controlar o problema sozinho, não negue, nem esconda. Os maiores inimigos de nós mesmos são o medo e a vergonha. Eles fazem com que o mal se instale. Por isso, procure ajuda profissional. O processo terapêutico ajuda muito no autoconhecimento, no manejo de situações de crise”, aconselha Ana